
Em 2007, os EUA também viveram um grande mistério. Mais de 24 estados sofreram o sumiço de mais de 50% de suas abelhas, o que causou sérios problemas para a agricultura. Não haviam corpos ou pistas dos motivos que fizeram milhares de abelhas abandonarem as colméias e as rainhas, e o mistério ainda perdura. Hoje sabemos que o problemas atingiu parte da Europa e até mesmo o Brasil. Uma das causas apontadas hoje em dia são as lavouras transgênicas, mas ainda não se sabe como isso afeta de fato as abelhas.
Assim começa o filme que ousarei defender filosoficamente hoje. Fim dos Tempos começa com o professor de ciências vivido por Mark Wahlberg questionando seus alunos sobre o que teria acontecido com estas abelhas. A conclusão na sala de aula é que ainda é um mistério. A trama segue ele e sua esposa fugindo de uma estranha epidemia que faz as pessoas se suicidarem da primeira e pior maneira possível. O filme de M. Night Shyamalan foi lançado em 2008 no Brasil com este título de filme-catástrofe, apesar do título original ser apenas "O Acontecimento". Mas de fato o filme é um filme-catástrofe, mas não como o título pode remeter a 2012, O Dia Depois de Amanhã e Independence Day, mas muito mais filosófico e subjetivo que Sinais, o filme de invasão alienígena que o diretor lançou com sucesso em 2002. O filme tem um suspense barato, mas com engajamento, metáforas e ambiguidade.
Fim dos Tempos foi lançado ainda na esteira da polêmica do diretor com a Disney, sua parceira desde O Sexto Sentido. O diretor insistia no complicado (mas pra mim nada confuso) roteiro de A Dama na Água, e com o sucesso de A Vila tudo o que os executivos não iriam querer dele seria um conto de fadas sem tom político, então o diretor rompeu com o estúdio alegando não ter mais liberdade. A briga do diretor até rendeu um livro "O Homem que Escuta Vozes: Ou, como M. Night Shyamalan arriscou sua carreira num conto de fadas" de Michael Bamberger. A Warner bancou A Dama na Água, mas o filme foi (infelizmente) um fracasso gigante de público e crítica, e o diretor foi fazer seu próximo filme na 20th Century Fox. Inicialmente o projeto tinha o título de "The Green Effect" (Efeito Verde), e só foi aprovado após mudança do título e extensiva mudanças no roteiro. Mesmo assim o filme recebeu a tão temida classificação R (menores de 17 anos só podiam assistir acompanhadas de um adulto) nos EUA.
Então o filme trata dos temas ambientais atuais citados no começo do texto, e que muita gente acha chato. E mais do que falar de como a natureza reage as nossas intervenções, o filme fala sobre como reagimos a tudo. Não à toa o diretor queria Amy Adams no papel da esposa do professor, e sem ter esta atriz escolheu a diva indie Zooey Deschanel. Ele queria uma atriz que parecesse alheia aos acontecimentos ao seu redor. Isso fica claro no fato da personagem ter apenas uma preocupação durante quase todo o filme: seu celular e um segredo que ela guarda nele. O mundo está acabando e ela só pensa no celular? É como estamos vivendo hoje. Muita gente acha este o pior filme do diretor, talvez pelo fato do diretor ter usado uma brisa como materialização do mal, fazendo assim homenagem a clássicos do suspense e cinema B como Os Pássaros e Anjo Exterminador; ou talvez pelos personagens não se desenvolverem como se espera num roteiro do diretor, mas como disse, os personagens estão mais preocupados consigo mesmos.
Nunca saberemos como seria o roteiro como o diretor o imaginou, sem a preocupação de deixá-lo mais comercial, mas acredito que o conceito moral que ele queria passar ainda está ali, o de que não estamos nem aí pra porra da natureza, contanto que possamos comprar nosso iPhone 4 e comemorar a virada do ano novo.
Em tempo, o filme seguinte do diretor O Último Mestre do Ar é o primeiro roteiro adaptado (de uma série animada) e é tecnicamente incrível, mas sofre do mal de ter de ser comercial e do roteiro mais preguiçoso que M. Night poderia escrever.