Em 1973 o ator e cenógrafo francês Jean Poiret montou uma peça chamada La Cage aux Folles, que com muito sucesso virou um filme em 1978. O filme conquistou o mundo, ganhou o Globo de Ouro de melhor filme estrangeiro e 3 indicações ao Oscar e ficou conhecido por aqui como A Gaiola das Loucas. O sucesso do filme francês rendeu duas continuações que não fizeram o mesmo sucesso, mas em 1983 a história ganhou uma versão musical na Broadway, e arrebatou naquele ano os principais prêmios Tony, o Oscar do teatro estadounidense. E em 1996, o diretor Mike Nichols gravou uma versão hollywoodiana um pouco mais contemporânea e contida estrelada por Robin Williams, Gene Hackman e Nathan Lane.
É baseado nesta versão da Broadway que o ator, escritor e dramaturgo Miguel Falabella trouxe para o Brasil A Gaiola das Loucas, mas totalmente em português e numa super produção que estreou primeiro no Rio de Janeiro, e está atualmente em cartaz no Teatro Bradesco em São Paulo. A primeira coisa que se pensa é que um ator e autor global tem todos os ingredientes para destruir a obra original que ganhou vários prêmios, ou para levar o humor para uma classe Zorra Total, mas não é o que acontece. Miguel tem uma grande experiência em teatro e adaptações musicais ao trazer para cá obras grandiosas como Rocky Horror Show, Os Produtores e Hairspray, sempre com ótimas cotações.
A trama mostra a chegada de um rapaz criado por um casal homossexual dono do cabaré "Gaiola das Loucas" em Saint Tropez, que precisa apresentar sua família para a noiva e seus conservadores pais, e como o pai da noiva é um poderoso político homofóbico que pretende varrer os cabarés da região, a única saída é que seus pais finjam ser heterossexuais e conservadores.
A versão de Miguel Falabella tem 3 horas de duração (com intervalo) e números musicais vibrantes, animados e muito bem ensaiados, mas ganha os melhores momentos justamente onde poderiam ser sua fraqueza, nas cenas puramente teatrais, ou seja, sem cantoria. Miguel interpreta o pai Georges a seu modo, repetindo gags de Caco Antíbes levando o público a gargalhar muito, mas sem se perder na trama, e chamou o amigo Diogo Vilela para viver o dífícil papel (que ele desempenha de forma surpreendente) do afetado Albin (que se apresenta no cabaré como Zazá). A sintonia dos dois está incrível, e com a adição do ator Jorge Maya (com vozeirão de Maria Alcina) como o afetadíssimo mordomo Jacó, o timing de comédia deixa o público sem fôlego.
Ao tratar o tema do preconceito numa comédia musical, a moral da história poderia ficar perdida ao final do espetáculo, mas tudo é tratado despudoradamente ao longo de toda a trama, o que facilita a quebra de preconceitos, pois acompanhamos o cotidiano de uma família dona de um cabaré onde a figura materna é um homem travestido, e nos divertimos com isso! E sempre vale a pena rir, mesmo que seja daquilo que não conhecemos e precisamos aprender.
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