Quando, em 1963, o autor francês Pierre Boulle lançou o seu "Planeta dos Macacos", livro em que criticava a sociedade européia de forma disfarçada, os tempos eram outros. Enquanto os livros de hoje muitas vezes já são lançados com contratos prevendo a transposição para as telas dos cinemas, os de antigamente só eram içados a tal patamar quando alcançavam efetivamente sucesso no ramo literário. E esse foi o caso da história onde os símios eram a raça dominante de um planeta, que foi transposta cinco anos depois com Charlton Heston liderando o elenco.
Dirigido por Franklin Shaffner, o filme foi recebido pela crítica como um discurso sobre a Guerra Fria, que ocorria entre as potências do momento. O filme tornou-se clássico ao longo dos tempos, angariando um séquito digno de Star Wars ou Star Trek. Não assisti ao original, muito menos as suas continuações. Tudo o que conhecia provinha de leituras sobre cinema até 2001, quando Tim Burton decidiu fazer o remake do primeiro filme. E não foi tão feliz...
A história era basicamente a mesma, os efeitos eram melhores, entretanto o roteiro falhava em inserir os espectadores no ambiente da história. É óbvio que o cenário é bem ficcional, mas ainda assim quando estamos no cinema esperamos que o filme nos leve a passear e conhecer um novo universo, e não me senti efetivamente inserido naquele mundo onde os macacos dominavam. Dessa forma, quando o prequel foi anunciado, a falta de publicidade não me incomodou. Esse seria um filme que assistiria em um dia em que sobrasse um tempo. E que bom ter tido pouca informação: a experiência tornou-se muito mais interessante!
PLANETA DOS MACACOS - A ORIGEM (Rise of the Planet of the Apes, 2011) nos apresenta à empresa GEN-SYS, onde os cientistas fazem ciência e os acionistas fazem dinheiro! Will Rodman (James Franco) busca incessantemente a cura para o Mal de Alzheimer, que aflige seu pai (John Lithgow, numa atuação no tom certo). Após um acidente no laboratório, Will leva para casa um filhote, César, que começa a demonstrar uma capacidade cognitiva que se desenvolve de forma surpreendente. O jovem cientista vê no pequeno macaco a possível salvação para o seu pai.
O roteiro, ao trazer os macacos para o "nosso" planeta, nos aproxima da história. Além disso, a busca por uma cura que todos desejamos na atualidade (e que vemos cada vez mais possível, através de alguns avanços da tecnologia de hoje) alcança sucesso onde o filme de Tim Burton falhou: a imersão ocorre de forma orgânica e evolui de forma harmoniosa.
O show promovido pela Weta Digital e pelo ator Andy Serkys se desenrola brilhantemente na tela. Aliás, não só César (Serkys), mas todos os símios são críveis. É uma contenda interessante: nosso senso nos diz que aquilo é inviável, mas nossa porção crível quer aceitar, a cada instante, que aquela "Revolução da Macacada" está realmente se formando. E, aqueles que conhecem a história do filme original, já esperam por um final anunciado.
Franco (que para mim não possuí uma presença de tela muito efetiva) atua de forma consistente e até mesmo os coadjuvantes de luxo Brian Cox e Tom Felton acrescentam de forma simples algo mais ao enredo que, sem dúvida nenhuma se centra em César. Sem diálogos (somente com uma pequena cena de "linguagem dos sinais", rs) os realizadores (direção de Rupert Wyatt e roteiro de Rick Jaffa e Amanda Silver) conseguem imprimir o tom de cada acontecimento dentro do centro de controle de animais a contento. As cenas de ação envolvendo os macacos também são vibrantes. A batalha na ponte Golden Gate é empolgante e arrojada, mostrando uma organização militar do símio típica do antigo imperador romano, que lhe empresta o nome.
A película possui alguns pequenos deslizes de roteiro (como uma personagem símia que, aparentemente, acabou cortada da versão final, mas que sobreviveu em algumas cenas), mas nada que incomode. A cena supracitada com a utilização da linguagem dos sinais é compreensível do ponto de vista do roteiro, mas estraga um pouco aquela característica crível de que falei.
Existem diversas citações (ou Easter eggs) inseridos ao longo do filme, mas confesso que não os percebi por completo por não ter assistido ao original ou ter lido o livro. Mas deve ser divertido, para os iniciados na saga, notar esses detalhes.
O filme diverte e, mesmo apostando em alguns clichês, consegue surpreender. Os créditos finais são excepcionais e guardam uma pequena cena que completa a obra de forma coerente, ligando-a de forma efetiva aos demais filmes e abrindo as portas para uma possível sequência. Sem falar que, ao melhor estilo Star Trek, reinventa de certa forma um universo que pode prosperar ainda.
Ótimo entretenimento, esse filme tem sido muito elogiado ao redor do mundo. E por puro merecimento. Como já se dizia antigamente, a César o que é de César...