Em minha visita aos EUA pude assistir ao musical How To Succeed in Business Without Really Trying (Como se dar bem nos negócios sem realmente tentar) na Broadway, e como foi uma experiência singular e o tema se encaixa em várias discussões, inclusive ao final da saga Harry Potter, resolvi escrever, mesmo sabendo que as chances deste musical vir a ser montado no Brasil sejam praticamente nulas.
O musical está em destaque na atual temporada da Broadway devido a presença de Daniel Radcliffe, o Harry Potter nos cinemas, como o protagonista J. Pierrepont Finch. E sim, ele surpreendentemente é capaz de atuar, dançar e cantar ao mesmo tempo com naturalidade. Mas ele não é a única atração desta remontagem.
Em 1952 o escritor americano Shepherd Mead escreveu o livro de mesmo nome, dando instruções satíricas sobre como se dar bem no mundo corporativo, baseado em sua experiência em agências de publicidade pelo mundo. O livro se tornou um best-seller instântaneo, e ajudou a estabelecer a imagem corporativa dos estadunidenses em todo o mundo. Em 1961 foi levado aos palcos da Broadway em forma de musical, com um personagem seguindo à risca as instruções do livro. Esta montagem ganhou 7 Prêmios Tony (o Oscar do Teatro), o Prêmio dos Críticos de Drama de Nova Iorque e o Pulitzer de Melhor Drama (prêmio máximo das artes que costuma agraciar 1 musical por década). Em 1967 foi a vez de Hollywood levar o musical para as telonas, com o mesmo elenco dos palcos.
o bizarro pôster da montagem original |
A história do musical mostra J. Pierrepont Finch (Radcliffe), um jovem lavador de janelas de uma grande agência de publicidade, que lê e segue rigorosamente as instruções do livro "Como se dar bem nos negócios sem realmente tentar" (nesta remontagem o livro é narrado pelo jornalista da CNN Anderson Cooper). Arquitetando encontros aparentemente acidentais com o presidente da empresa J. B. Biggley (John Larroquette, vencedor do Tony de melhor ator coadjuvante neste ano), ele vai conquistando todos à sua volta, e sem querer o coração da secretária Rosemary Pilkington (Rose Hemingway) que talvez seja a única a enxergar o verdadeiro Pont por trás do ambicioso Finch. Mesmo sem estudo, o rapaz passa de lavador de janelas a vice-presidente da empresa, e não mede esforços pra derrubar quem esteja no seu caminho.
Foi curioso ver Daniel interpretar uma espécie de anti-herói americano, muito diferente de seu famoso personagem bruxo. Mas como todo bom conto americano de superação e ambição, o fato do personagem não ter ética pra se promover é ignorado ao final, e gestos onde ele manipula o mal para parecer o bem são mostradas de forma positiva (como na cena em que ele recebe o convite para uma promoção, e a rejeita passando para seu atual superior, um senhor que está no mesmo cargo há 25 anos, quando na verdade ele ambiciona um cargo ainda maior, e sabe que seu ato o colocará em visibilidade), e os personagens que ele derruba, apesar de terem os mesmos atos de Finch, são mostrados comicamente como merecedores de seus destinos. Mas o amor sempre vence, e passa por cima das questões éticas.
Não que isso torne o espetáculo inferior, afinal como o título da remontagem deixa claro, se trata de uma comédia musical, e como o livro, uma sátira de toda essa falta de decoro corporativo. Porque infelizmente, como na vida real, todo bom canalha se dá bem. Me vem sempre à mente o filme À Procura da Felicidade estrelado por Will Smith, baseado em fatos reais, que mostra um homem que põe em risco sua família ao não aceitar qualquer emprego, e fazendo sua esposa trabalhar praticamente sozinha pra sustentá-los, em busca do sonho de se tornar um executivo. No final, por um acaso insistente, ele consegue se tornar um executivo, mas o fato de ter estressado sua esposa ao ponto dela fugir tentando lhe dar mais responsabilidade, e de ter feito seu filho dormir na rua pela falta de dinheiro não contam negativamente. A única coisa que conta é o sonho americano e aqueles que não acreditaram neste sonho. Eu não acredito neste sonho em detrimento de outras pessoas.
Sarah J. Parker e Broderick |
Robert Morse, ator da primeira montagem, venceu o Tony de melhor ator em musical, e hoje está na premiada série Mad Men, exibida no Brasil no canal HBO, que fala exatamente sobre o mundo publicitário nos anos 60. O produtor da série já disse ter usado o musical como referência na criação da série, e deu a entender que o bem sucedido Bertram Cooper que Morse interpreta seja uma alusão ao personagem Finch, que se deu bem sem muito esforço. Mathew Broderick também ganhou o Tony numa remontagem em 1995, que também tinha Megan Mullally (a Karen da série Will & Grace) e depois a futura esposa de Broderick, Sarah Jessica Parker (Sex & The City) como Rosemary.
"Been a Long Day" no elevador |
A última edição do Tony não agraciou Daniel Radcliffe, que está apenas em seu segundo espetáculo teatral, sendo o primeiro o polêmico Equus, que falava sobre a iniciação sexual de um rapaz e sua amizade com um cavalo, e onde o ator aparecia nu. Mas não me resta dúvidas sobre a perseverança, disciplina e capacidade do ator em se tornar de fato um ator. No espetáculo ele canta bem e de acordo com as características do personagem, dança em praticamente todas as músicas, inclusive se jogando no chão e fazendo coisas de um ginasta, e atua com tamanha personalidade que é capaz de colocar uma piada interna referente ao episódio do Tom Cruise declarando seu amor a Kate Holmes no programa da Oprah. E lembrar que ele é o mais rico inglês com menos de 30 anos, e que o espetáculo de mais de 2 horas de duração é exibido 2 vezes ao dia, ao menos 5 vezes por semana desde março só aumenta a admiração ao ator.
Abaixo estão dois clipes do musical. O primeiro começa com diversos flashes do espetáculo ao som da música tema, e mostra trechos de vários dos mais de 30 números, e o segundo é uma apresentação completa no Tony Awards deste ano do número "Brotherhood", onde Finch precisa se safar de sua primeira e muito mal sucedida campanha publicitária como vice-presidente, e pra isso ele tenta tocar o lado sentimental do maior acionista da empresa falando sobre como os funcionários da empresa são unidos como uma irmandade.
Assisti a esse fantástico musical também e confesso que me surpreendi com a atuação de Daniel Radcliffe! Ele prova com essa performance na Broadway que não ator de apenas um papel! E claro que a produção e os demais participantes do elenco, contribuem para que esse seja um espetáculo e tanto para a memória! Foi muito, muito bacana!!
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