Ao ver Pedro Bial todas as noites saudar os "heróis da nave Big Brother", fica a certeza de que não havia momento mais oportuno para a Panini Comics lançar no Brasil a HQ HellBlazer: Passagens Sombrias (HellBlazer: Dark Entries, 2010). Fruto de um projeto da Vertigo de lançar histórias policiais (Vertigo Crime), essa talvez tenha sido a única a utilizar um personagem já famoso: John Constantine.
O mago inglês - criado por um trio encabeçado por Alan Moore e que teve sua primeira aparição na Graphic Novel Swamp Thing - é um mestre do ocultismo, executando exorcismos e "salvando pessoas", sempre de uma forma negligente e arrogante. Seu ambiente é o sobrenatural, enfrentando demônios e monstros, contando com o taxista Chas, com quem invariavelmente discute. Chegou a enganar o próprio Lúcifer, se livrando através deste de um câncer nos pulmões. Essa história, inclusive, foi mote para a adaptação aos cinemas. É um bom filme, mas foi muito criticado pelos fãs pelas "liberdades criativas" dos envolvidos (Keanu Reeves vive o anti-herói, que no gibi se parece fisicamente com o Sting e não é nem um pouco americano; o nome foi alterado para Constantine, para que não confundissem com Hellraiser...).
Em Passagens Sombrias, John é convocado por um produtor para investigar acontecimentos estranhos em um reality show(!). O mote do programa e colocar pessoas em uma casa e assustá-las até que uma encontre a saída. Entretanto, os sustos que tem acontecido não são fruto dos efeitos especiais da produção. Será a casa mal assombrada?
Tudo isso nos é explicado em poucas páginas da HQ. O roteirista Ian Rankin demonstra um timing correto e pacing coerente com o local onde tudo acontece. Sua experiência como escritor de romances policiais se faz evidente na forma como ele gasta o tempo correto com cada um dos seis concorrentes dentro da casa, permitindo que criemos vínculos (pelos mais variados motivos) com cada um deles. É difícil falar mais sem correr o risco de estragar as surpresas da trama.
A arte em preto-e-branco de Werther Dell'edera deixa um pouco a desejar. Ela não possui personalidade própria, flertando com o visual mangá em vários momentos. Hoje em dia, os grandes artistas de quadrinhos sabem utilizar bem o espaço que possuem. Não são só as personagens que contam, mas o ambiente também. E esse merece ser melhor retratado, algo que senti falta nessa HQ. Tudo bem que o cenário é, basicamente, o mesmo (a casa), mas um pouco mais de cuidado ajudaria no resultado final. A falta de cores não atrapalha, ajudando no tom seco e ágil da história. Fica a impressão de que a Panini também pensou assim, trazendo a HQ no formado pocket, em clara evidência de que o roteiro conta mais que a arte.
A leitura é rápida e divertida. Lembra em muito o desenrolar de um reality show: lento e explorativo no início; veloz e urgente do meio para a frente. Constantine está um pouco menos amargo e mais prestativo do que o habitual. Quem conhece o inglês talvez estranhe um pouco. Entretanto, é o final que surge como o seu calcanhar de Aquiles, um pouco apressado demais. Talvez se tivessem gastado um pouco mais de tempo com ele teríamos um final mais interessante. Mas nada que interfira na diversão.
O selo Vertigo, da DC Comics, sempre busca trazer novidades, fora do circuito dos super-heróis usuais. Recomendo a leitura deste e de muitos outros títulos desta. É uma forma "to think outside the box", como dizem os americanos. Fica a dica!
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