"Tempo para Prosperar" |
Na mesma semana em que Caio Castro, 25 anos, ator da Rede Globo que já assumiu nunca ter pensado em ser artista, deu uma polêmica entrevista pra jornalista Marília Gabriela se dizendo evangélico e não apreciador de literatura e teatro, só tendo contato por obrigação durante a oficina de atores da emissora, a famosa atriz canadense indicada ao Oscar Ellen Page, 26 anos, assumiu sua homossexualidade durante a conferência “Tempo para Prosperar” da Fundação Campanha pelos Direitos Humanos em parceira com a Associação Educação Nacional dos EUA e Associação Americana de Aconselhamento.
Castro não é diferente de outros, e ele simplesmente
não gosta de teatro e literatura, assim como não deve gostar de jiló. O que
está em debate é a ética. Todos os profissionais têm a sua. Os artistas também,
independente de suas opiniões. Um médico pode abominar o ato de abortar um
bebê, mas não poderá negar socorro a uma mulher que sofra as consequências de
um mal feito.
Pouco se fala sobre a ética de artistas. Sempre se lembra da
excentricidade (por vezes uma ação antiética) deles. Mas um dos pais do teatro
atual, Constantin Stanislavski discute o assunto dentro de seu sistema com o
exemplo do jovem ator, fã de um veterano famoso que vivia um personagem muito
íntegro no teatro com quem teve o privilégio de jantar, mas teve de aturar o
ídolo bêbado, arrogante e ainda pagar toda a conta do jantar. A magia da arte
imediatamente acaba ao se perceber que o artista não tem a menor responsabilidade
social, apenas talento no palco. É um tema delicado, mas a função do ator é
pesquisar questões que pertencem a todos (seja física, política, moral), com alguns sendo mais engajados,
outros menos.
Miguel Falabella diz o que pensa, com razão. |
é difícil achar uma foto do ator usando camisa |
Caio Castro pode não gostar de teatro e literatura, e
preferir fazer exercícios e tirar fotos do abdômen definido, mas ao causar a
fúria de colegas de trabalho que começaram no teatro, e veem o teatro como o
berço de todo ator, como Ingrid Guimarães, Pedro Paulo Rangel e Miguel
Falabella, os desrespeitou. Sem contar aqueles que não expuseram sua
indignação. Sem contar os jovens que acharão que ser ator é ter um corpo sarado, não estudar, e ser apenas celebridade. Concluímos que certas opiniões pessoais possam soar tão ultrajantes
para alguns, e não agregar nada a outros, que o melhor seria guardar para si, e não dividir publicamente.
Mas Ellen Page vir a público falar de algo igualmente pessoal seria antiético? Muito pelo contrário. Um dos papéis do ator na sociedade é discutir o que importa, então um engajamento social de tal relevância é muito bem vindo desde que mais ajude que ofenda as pessoas, como é o caso. Ela começa o discurso na conferência que promove a segurança, inclusão e bem estar de jovens LGBTQ (lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros e questionandos) em todos os lugares (lar, escola, comunidade) dizendo “é estranho que aqui estou eu, uma atriz, representando – pelo menos de alguma maneira – uma indústria que impõe padrões esmagadores em todos nós, não só em jovens, mas em todos. Padrões de beleza, de uma vida boa, de sucesso. Padrões que, eu devo admitir, têm me afetado”. Ela cita o questionamento da imprensa pelo tipo de roupa que usa, que julgam masculinas, no que responde que as usa por serem mais confortáveis. Assim como milhares de jovens oprimidos por alguns destes padrões e outros mais antigos que o cinema sem o menor contato com qualquer tipo de política pública, muitos deles espectadores de Ellen em filmes como “Juno”, “X-Men” e “A Origem” ou no videogame "Beyond: Two Souls" ela os representa ao se assumir dizendo “Estou aqui hoje porque sou gay. E porque talvez eu possa fazer a diferença. Para ajudar outros a ter um tempo mais fácil e esperançoso. Apesar de tudo, por mim, eu sinto uma obrigação pessoal e uma responsabilidade social”, e continua “Eu estou cansada de me esconder e estou cansada de mentir por omissão, eu sofri por anos porque estava assustada de me assumir. Meu espírito sofreu, minha saúde mental sofreu e meus relacionamentos sofreram. E estou aqui hoje, com todos vocês, do outro lado de toda esta dor”.
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